A legítima responsabilidade social na iniciativa privada

Por Adriano Amui

Uma busca no Google com a expressão ‘Responsabilidade Social’ não aponta em seus primeiros resultados conceitos e definições, mas sim sites de diversas empresas, entre elas bancos que até usam este tema como link patrocinado, uma usual ferramenta de marketing.

Esse resultado nos dá a dimensão de que esta é uma das expressões que mais esteve (e está) em voga nos últimos anos, pois há a crença de que ficar fora deste conceito gera má impressão e eventuais problemas com imagem. Na verdade, ser socialmente responsável já virou condição sine qua non para uma empresa ser considerada séria e idônea.

Há costumeiras confusões com o uso do termo quando aplicado ao mundo da iniciativa privada, que pode ser interpretado, pelo menos, de duas formas distintas: 1) empresa que administra bem seus recursos e sua relação com a sociedade, causando menos impactos ambientais, sociais e econômicos, no que tange o bom uso de recursos naturais e insumos, mão-de-obra e rentabilidade; 2) assumir práticas de “bem-estar social”, o que caracterizaria uma relação “ética”, pois parte da ideia de que a empresa devolve à sociedade parte daquilo que recebe.

Podemos ter uma ideia de como este conceito faz parte do imaginário coletivo de forma idealizada examinando definições que aparecem na rede mundial de computadores. A própria Wikipedia, principal enciclopédia colaborativa da web, descreve Responsabilidade social corporativa como “o conjunto amplo de ações que beneficiam a sociedade e as corporações, levando em consideração economia, educação, meio ambiente, saúde, transporte, moradia, atividade locais e governo”. Segundo o artigo, “essas ações otimizam ou criam programas sociais, trazendo benefícios mútuos entre a empresa e a comunidade, melhorando a qualidade de vida dos funcionários, a atuação da empresa e a população”.

Conforme dito acima, há um paradigma em torno da ética da empresa. Ainda na mesma enciclopédia livre temos que “ser ético e transparente quer dizer conhecer e considerar suas partes interessadas objetivando um canal de diálogo”, o que, de cara, cria um círculo vicioso, pois as empresas têm de se empenhar para construir uma imagem ética por meio de práticas sociais, culturais ou ambientais, mas, caso não o façam, caem em mau julgamento. Pesquisa realizada pela Market Analisys mostra que no Brasil o percentual da população que atribui às empresas – e não ao governo – o papel de resolver problemas sociais é bem superior ao de outros países. Aqui, 65% dos brasileiros acha que é das empresas a função de resolver as mazelas sociais. Estamos à frente das expectativas de países como Argentina, com 51%, e Rússia, com 47% . Uma total inversão de valores, em meu ponto de vista!

Não é preciso lembrar um cidadão brasileiro de quanto se paga em impostos todos os meses, mas talvez seja necessário refrescar sua memória em relação ao uso deste dinheiro. Pois, se, mesmo arrecadando tanto, o Governo não assumir práticas sociais, quem as assumiria? A sociedade? Iremos admitir a isenção desta função ao Estado, ou repassaremos a tarefa a empresas?

Aos que pensariam em dizer que queremos mexer em algo consolidado e criar novas e vãs teorias, é oportuno lembrar que já, na década de 70, Milton Friedman, um dos mais influentes economistas do século XX, relativizara esta questão. Em seu artigo, “The Social Responsibility of Business Is to Increase Its Profits”, Friedman critica o uso dos lucros corporativos em função de gastos sociais, que são de responsabilidade do Estado. Pois, ao usar a verba de uma empresa para este tipo de ação, os preços dos produtos ou serviços da empresa em questão se elevam e a sociedade paga por isso duplamente, já que também contribui com impostos. Tratando mais detalhadamente, a questão da “responsabilidade” social passa, necessariamente, pelas ações dos executivos das empresas, pois são eles que devem agir em prol de sua corporação. Segundo o autor, estes executivos devem ter responsabilidade para com suas empresas e seus acionistas, já que é o dinheiro alheio que administra e não seus próprios bens. Como “pessoa física” ou cidadão ele pode sim usar seus recursos, seu tempo e sua energia em ações sociais, entretanto fazer uso da infra-estrutura alheia, ou seja, de sua corporação não é socialmente justo, pois isto pode acarretar num aumento de preço dos produtos e num impacto direto à toda cadeia de produção, inclusive atingindo o cotidiano de seus funcionários, que talvez tenham um prejuízo refletido em seu salário, no que tange a falta de aumentos.

Chegamos, enfim, a hora de separar o joio do trigo. Devemos colocar cada coisa em seu lugar, já que o termo “responsabilidade social” e suas derivações criaram, ao longo destes anos, toda uma iconografia imaculada. Bela e com ares de marketeira. Para se conseguir isso, devemos pensar: o que vale mais, uma política a la Robin Wood, mas que, em vez de tirar o dinheiro dos ricos e entregar para os pobres, tira do bolso de toda a sociedade em prol de uma imagem “politicamente correta” ou uma administração responsável, visando claramente seus lucros (afinal, empresas não são entidades filantrópicas) e que respeite sempre a melhor relação custo- benefício de seus clientes, empregados e acionistas? O que de fato parece ser mais responsável como sempre, não são os modismos.

 

Adriano Maluf Amui é diretor do INVENT® (Instituto Nacional de Vendas e Trade Marketing) e da Esfera Gestão Empresarial, e professor na ESPM e Mackenzie. Formado em Administração de Empresas pela FESP-PR, possui pós-graduação em Finanças e Investimentos pela ISPG, Mestrado em Administração de Empresas pela FGV e especialização Avançada em Gestão de Negócios/Marketing pela Kellogg University – Northwestern University. Sua experiência profissional inclui atuação como Executivo em empresas de grande porte como Shell, Parmalat e Nestlé.

 

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